quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Competências e Responsabilidades na Adm. Pública

A repartição das competências para a prestação de serviço público ou de utilidade pública pelas três entidades estatais – União, Estado-membro, Município – opera-se segundo critérios técnicos e jurídicos, tendo-se em vista sempre os interesses próprios de cada esfera administrativa, a natureza e extensão dos serviços, bem como a capacidade para executá-los vantajosamente para a Administração e para os administrados.

A Constituição de 1988 manteve a mesma linha básica de repartição de competências advinda das Constituições anteriores: poderes reservados ou enumerados da União (arts. 21 e 22), poderes remanescentes para os Estados (art. 25, § 1º) e poderes indicativos para o Município (art. 30). Não obstante, procurou distinguir a competência executiva da competência legislativa. A primeira é a competência material para a execução dos serviços, que pode ser privativa (art. 21) ou comum (art. 23). A Segunda refere-se à capacidade de editar leis e pode ser também privativa (art. 22), concorrente (art. 24) e suplementar (arts. 22, § 2º, e 30, II).

A competência da União limita-se a estabelecer normas gerais (§ 1º); estas, porém, não excluem a legislação complementar dos Estados (§ 2º); inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades (§ 3º); mas a superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário (§ 4º).

A competência legislativa suplementar foi deferida aos Estados (art. 24, § 2º), mas estendida também aos Municípios, aos quais compete “suplementar a legislação federal e estadual no que couber” (art. 30, II).

A competência da União em matéria de serviços públicos abrange os que lhe são privativos, enumerados no art. 21, e os que são comuns, relacionados no art. 23, que permitem atuação paralela dos Estados-membros e Municípios. Dentre os primeiros cabe destacar a defesa nacional (inc. III); a polícia marítima, aérea e de fronteiras (inc. XXII); a emissão de moeda (inc. VII); o serviço postal (inc. X); os serviços de telecomunicações em geral (incs. XI e XII); de energia elétrica (inc. XII, “b”); de navegação aérea, aeroespacial e de infra-estrutura portuária (inc. XII, “c”); os de transporte interestadual e internacional (inc. XII, “d” e “e”); de instalação e produção de energia nuclear (inc. XXIII); e a defesa contra calamidades públicas (inc. XVIII). Alguns desses serviços só podem ser prestados pela União; outros admitem execução indireta, através de delegação a pessoas de Direito Público ou Privado e a pessoas físicas.

Quanto aos serviços comuns, relacionados no art. 23, lei complementar deverá fixar normas para a cooperação entre as três entidades estatais, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional (parágrafo único). Para alguns desses serviços, porém, como o de saúde, a Constituição já determinou que sua prestação seja feita através de um “sistema único”, envolvendo todas as entidades estatais (art. 198).

A competência do Estado-membro para a prestação de serviços públicos não está discriminada constitucionalmente, pela razão de que, no nosso sistema federativo, o constituinte enunciou as matérias reservadas à União e as de competência comum entre as entidades estatais (arts. 21 e 23), deixando as remanescentes para os Estados (art. 25, § 1º). A única exceção feita diz respeito à exploração e distribuição dos serviços de gás canalizado, que afasta inclusive a competência do Município para sua distribuição local (art. 25, § 2º).

Não se podem relacionar exaustivamente os serviços da alçada estadual, porque variam segundo as possibilidades do Governo e as necessidades de suas populações. Por exclusão, pertencem ao Estado-membro todos os serviços públicos não reservados à União nem atribuídos ao Município pelo critério de interesse local. Nesse sentido, cabem ao Estado os serviços e obras que ultrapassam as divisas de um Município ou afetam interesses regionais. Pela mesma razão, compete ao Estado-membro a realização de serviços de interesse geral, ou de grupos ou categorias de habitantes disseminados pelo seu território, e em relação aos quais não haja predominância do interesse local sobre o estadual.

A competência do Município para organizar e manter serviços públicos locais está reconhecida constitucionalmente como um dos princípios asseguradores de sua autonomia administrativa (art. 30). A única restrição é a de que tais serviços sejam de seu interesse local. O interesse local, já definimos, não é o interesse exclusivo do Município, porque não há interesse municipal que o não seja, reflexamente, do Estado-membro e da União. O que caracteriza o interesse local é a predominância desse interesse para o Município em relação ao eventual interesse estadual ou federal acerca do mesmo assunto.

Não obstante, a Constituição de 1988 inovou em alguns aspectos ao eleger determinados serviços de interesse local em dever expresso do Município. É o que ocorre com o transporte coletivo, com caráter de essencialidade (art. 30, V); com a obrigação de manter programas de educação pré-escolar e de ensino fundamental (inc. VI); com os serviços de atendimento à saúde da população (inc. VII); com o ordenamento territorial e o controle do uso, parcelamento e ocupação do solo urbano (inc. VIII); e com a proteção ao patrimônio histórico-cultural local (inc. IX). A indicação expressa de tais serviços pelo texto constitucional torna-os prioritários em relação aos demais, constituindo sua falta grave omissão dos governantes municipais (Prefeito e Vereadores).

A Constituição outorga, ainda, ao Município a competência expressa para “criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual” (art. 30, IV).

Concluindo, podemos afirmar que serviços da competência municipal são todos aqueles que se enquadrem na atividade social reconhecida ao Município, segundo o critério da predominância de seu interesse em relação às outras entidades estatais.

A prestação do serviço público ou de utilidade pública pode ser centralizada, descentralizada e desconcentrada, e sua execução, direta e indireta (não se confunda com Administração direta e indireta).

Serviço centralizado é o que o Poder Público presta por seus próprios órgãos em seu nome e sob sua exclusiva responsabilidade. Em tais casos o Estado é, ao mesmo tempo, titular e prestador do serviço, que permanece integrado na agora denominada Administração direta (Dec.-lei 200/67, art. 4º, I)

Serviço descentralizado é todo aquele em que o Poder Público transfere sua titularidade ou, simplesmente, sua execução, por outorga ou delegação, a autarquias, entidades paraestatais, empresas privadas ou particulares individualmente. Há outorga quando o Estado cria uma entidade e a ela transfere, por lei, determinado serviço público ou de utilidade pública; há delegação quando o Estado transfere, por contrato (concessão) ou ato unilateral (permissão ou autorização), unicamente a execução do serviço, para que o delegado o preste ao público em seu nome e por sua conta e risco, nas condições regulamentares e sob controle estatal.

A distinção entre serviço outorgado e serviço delegado é fundamental, porque aquele é transferido por lei e só por lei pode ser retirado ou modificado, e este tem apenas sua execução transpassada a terceiro, por ato administrativo (bilateral ou unilateral), pelo quê pode ser revogado, modificado e anulado, como o são os atos dessa natureza. A delegação é menos que outorga, porque esta traz uma presunção de definitividade e aquela de transitoriedade, razão pela qual os serviços outorgados o são, normalmente, por tempo indeterminado e os delegados por prazo certo, para que ao seu término retornem ao delegante. Mas em ambas as hipóteses o serviço continua sendo público ou de utilidade pública, apenas descentralizado, contudo, sempre sujeito aos requisitos originários e sob regulamentação e controle do Poder Público que os descentralizou.

A descentralização pode ser territorial ou geográfica (da União aos Estados-membros e destes aos Municípios) ou institucional, que é a que se opera com a transferência do serviço ou simplesmente de sua execução da entidade estatal para suas autarquias, entes paraestatais e delegados particulares.

Serviço desconcentrado é todo aquele que a Administração executa centralizadamente, mas o distribui entre vários órgãos da mesma entidade, para facilitar sua realização e obtenção pelos usuários. A desconcentração é uma técnica administrativa de simplificação e aceleração do serviço dentro da mesma entidade, diversamente da descentralização, que é uma técnica de especialização, consistente na retirada do serviço dentro de uma entidade e transferência a outra para que o execute com mais perfeição e autonomia.

Os serviços centralizados, descentralizados ou desconcentrados admitem execução direta ou indireta, porque isto diz respeito a sua implantação e operação, e não a quem tem a responsabilidade pela sua prestação ao usuário. Impõe, portanto, distinguir prestação centralizada, descentralizada ou desconcentrada do serviço, de execução direta ou indireta desse mesmo serviço.

Execução direta do serviço é a realizada pelos próprios meios da pessoa responsável pela sua prestação ao público, seja esta pessoa estatal, autárquica, paraestatal, empresa privada ou particular. Considera-se serviço em execução direta sempre que o encarregado de seu oferecimento ao público o realiza pessoalmente, ou por seus órgãos, ou por seus prepostos (não por terceiros contratantes). Para essa execução não há normas especiais, senão aquelas mesmas constantes da lei instituidora do serviço, ou consubstanciadora da outorga, ou autorizadora da delegação a quem vai prestá-lo aos usuários.

Execução indireta do serviço é a que o responsável pela sua prestação aos usuários comete a terceiros para realizá-lo nas condições regulamentares. Serviço próprio ou delegado, feito por outrem, é execução indireta. Portanto, quer a Administração direta, quer a Administração indireta (autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista) como, também, os entes de cooperação (fundações, serviços sociais autônomos etc.), ou as empresas privadas e particulares que receberem serviços públicos ou de utilidade pública para prestar aos destinatários, podem, em certos casos, executar indiretamente o serviço, contratando-o (não delegando) com terceiros.

A possibilidade de execução indireta depende, entretanto, da natureza do serviço, pois alguns existem que não admitem substituição do executor, como, p. ex., os de polícia, e para outros a própria outorga ou delegação proíbe o traspasse da execução. Mas o que se deseja acentuar é que a execução indireta é meio de realização do serviço, que tanto pode ser empregado pelo Estado como por aqueles a quem ele transferiu o serviço ou sua prestação aos usuários, observando-se, ainda, que execução indireta não se confunde com prestação descentralizada, desconcentrada e centralizada de serviço, que se referem à forma de prestação desse mesmo serviço, e não ao meio de sua execução.


Feitas essas considerações de ordem geral, vejamos, agora, as formas descentralizadas de prestação de serviços públicos e de utilidade pública, que se outorgam às autarquias e entidades paraestatais, ou se delegam a concessionários, permissionários e autorizatários, ou se executam por acordos sob a modalidade de convênios e consórcios administrativos.

Fonte: PROF. MANOEL ERHARDT
http://intervox.nce.ufrj.br/~diniz/d/direito/adm-CURSO_DE_DIREITO_ADMINISTRATIVO_Erhardt.doc

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